As medidas de prevenção contra o coronavírus recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como lavar as mãos com água e sabão, são quase impossíveis de serem adotadas por boa parte da população do Brasil. Dados do Sistema Nacional de Informação sobre o Saneamento (SNIS) mostram que 35 milhões de brasileiros não têm acesso a água tratada e cerca de 100 milhões não têm serviço de coleta de esgoto.
Considerado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, como pauta prioritária da Casa para 2020, o novo marco regulatório do saneamento básico (PL 4.162/2019), projeto já analisado pela Câmara, pode ir a Plenário virtual para votação remota pelo senadores.
Com o agravamento da crise provocada pela pandemia de Covid-19, a matéria foi listada pela equipe econômica do governo entre as que devem ter a tramitação acelerada no Congresso Nacional.
O maior impasse em torno do projeto é sobre o modelo proposto, que permite abrir mais caminho para o envolvimento de empresas privadas no setor. Parlamentares da oposição alegam que a exigência de licitações e as metas de desempenho para contratos tenderão a prejudicar e alienar as empresas públicas. Além disso, o texto estabelece prioridade no recebimento de auxílio federal para os municípios que efetuarem concessão ou privatização dos seus serviços.
Atualmente, a proposta tramita na Comissão de Meio Ambiente (CMA), onde é relatada por Alessandro Vieira (Cidadania-SE). O senador já sinalizou que fez ajustes de redação para garantir que as novas regras não prejudiquem as cidades menos desenvolvidas e os cidadãos com mais dificuldades de acesso ao tratamento sanitário.
— A convicção sobre a necessidade de um novo marco regulatório para o saneamento que incentive investimentos, que abra mercado, e que permita definitivamente aos brasileiros ter acesso a água potável e a esgotamento sanitário se mostra cada vez mais relevante nesse cenário em que vivemos, de epidemia. O relatório está pronto para ir à votação, no momento que for definido pela cúpula do Senado Federal. A gente tem defendido que seja um dos projetos prioritários, tanto porque ele é relevante para o aspecto sanitário como também porque ele alavanca investimentos em um momento que a nossa economia vai precisar disso e da retomada de empregos. É um projeto muito oportuno — avaliou Alessandro.
As alterações na CMA não devem afetar a decisão final do Senado sobre o projeto original, evitando que o texto volte para análise dos deputados. Se a proposta não for levada diretamente para votação em Plenário, ainda deve passar pela Comissão de Infraestrutura (CI), cujo relator é Tasso Jereissati (PSDB-CE). O senador é autor de outro projeto (PL 3.261/2019) para regulamentar o setor, já aprovado no Senado, mas que foi arquivado pela Câmara.
Os objetivos do PL 4.162/2019 são centralizar a regulação dos serviços de saneamento na esfera federal, instituir a obrigatoriedade de licitações e regionalizar a prestação a partir da montagem de blocos de municípios.
A principal novidade é o fim dos contratos de programa, instrumentos pelos quais os municípios transferem a execução dos seus serviços de saneamento para empresas públicas dos governos estaduais. Os contratos contêm regras de prestação e tarifação, mas permitem que as estatais assumam os serviços sem concorrência. Em lugar deles, entrarão as licitações, envolvendo empresas públicas e privadas.
Para viabilizar economicamente a prestação para cidades menores, mais isoladas ou mais pobres, o texto determina que os estados componham grupos de municípios, ou blocos, que contratarão os serviços de forma coletiva. Municípios de um mesmo bloco não precisam ser vizinhos. A adesão é voluntária — uma cidade pode optar por não ingressar no bloco estabelecido para ela e licitar sozinha.
Pela proposta, a regulação do saneamento básico do Brasil ficará a cargo da Agência Nacional de Águas (ANA), uma agência federal. O projeto exige dos municípios e dos blocos de municípios que implementem planos de saneamento básico, e poderá oferecer apoio técnico e ajuda financeira para essa tarefa.
O senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO) destacou em postagem na internet que o novo marco legal do setor é também uma das propostas da agenda legislativa da indústria, que defende a abertura de mercado para empresas públicas e privadas, e uma necessidade de saúde pública.
“A falta de saneamento prejudica a saúde da população. Inúmeras doenças, e nelas se incluem o coronavírus, podem ser evitadas com a melhoria da infraestrutura nessa área”, ressalta.
Nesse sentido, para cobrir os custos do fornecimento dos serviços de saneamento para suas residências, o projeto prevê que as famílias de baixa renda poderão receber subsídios, tarifários ou não. Elas também poderão ter gratuidade na conexão à rede de esgoto.
O projeto também estende os prazos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305, de 2010) para que as cidades encerrem os lixões a céu aberto. Os novos prazos vão de 2021 (para capitais e regiões metropolitanas) até 2024 (para municípios com até 50 mil habitantes).
A proposta ainda permite aos municípios e ao Distrito Federal cobrar tarifas sobre outros serviços de asseio urbano, como poda de árvores, varrição de ruas e limpeza de estruturas de drenagem de água da chuva.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)