O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), membro titular da CPI da Covid, considera que o presidente Jair Bolsonaro será responsabilizado ao final dos trabalhos do colegiado como o “grande chefe” de uma política desastrosa no enfrentamento à pandemia. Para o senador, todas as linhas de investigação levam ao presidente da República, entre elas o atraso na compra de vacinas.
Ele considera que Bolsonaro tenta desestabilizar o país e que a situação do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello com o Exército torna o retorno do general à comissão ainda mais delicado.
Já existem indícios na CPI da Covid contra o presidente Jair Bolsonaro?
Na verdade, há vários indícios em várias linhas de investigação, e todas têm uma coisa em comum, que é o Bolsonaro. O problema leva ao Bolsonaro. Se você for falar de vacina, onde parou o processo de compra, a lentidão, você vai no Pazuello, vai no outro, e acaba no Bolsonaro. Se você fala em críticas e obstáculos ao afastamento social e ao uso de máscara… Bolsonaro. Pode criticar o ministro da Saúde, mas acaba no Bolsonaro. Sobre a cloroquina, por que essa prescrição de um remédio sem comprovação científica, quem fez, quem não fez, segue a linha e acaba no Bolsonaro. E agora estamos vivendo esse problema de aglomeração, com uma ameaça, se já não uma realidade, de terceira onda. E o Ministério da Saúde praticamente imobilizado, não se pronuncia sobre essa aglomeração, se promove uma Copa América. E o que tem por trás disso? Bolsonaro. Então, todos os indícios levam ao grande chefe disso tudo, o grande chefe dessas falhas todas é sem dúvida nenhuma o Bolsonaro, cercado por maus conselheiros.
Então já é possível falar em algum tipo de responsabilização em relação ao presidente?
A responsabilização, com certeza, vai chegar ao presidente Bolsonaro. Evidentemente. Porque todas as declarações (dadas à CPI) que coincidem, em todos os aspectos, levam ao grande mentor, não como um grande mentor intelectual, mas o grande ordenador. E aconselhado por uma equipe paralela ao governo oficial, que o levou a esse negacionismo e a essa política desastrosa.
O que o senhor acha do perfil do presidente, que mesmo com a CPI funcionando, com novas evidências surgindo, mantém a direção e continua fazendo provocações aos membros da comissão?
A postura dele é provocadora. Parece-me que ele já passou do limite de fazer algum tipo de enfrentamento racional às coisas que estão sendo obtidas na CPI e passou a uma provocação não só à CPI, mas ao país inteiro. O máximo da provocação foi quando o ex-ministro Pazuello esteve na CPI e jurou perante a Deus e a Constituição Brasileira, como um militar, um general, de quem se espera uma palavra altiva e corajosa, que era a favor do afastamento e rigoroso em relação a uso de máscara. E dois dias depois ele estava fazendo em cima de um palanque, ao lado do presidente, uma manifestação justamente pelo contrário. Eu acho que o presidente hoje está claramente buscando desestabilizar o país.
Com a decisão do Exército de não punir Pazuello por participar de ato político, a reconvocação e uma eventual punição do ex-ministro fica mais delicada?
É claro que fica mais delicado. No momento em que todo o Brasil pensava, em função daqueles que conhecem a importância da hierarquia e da disciplina na vida militar, que houvesse uma manifestação muito clara do alto comando do Exército, e isso não aconteceu, isso nos deixa muito preocupados. E eu acho que o ministro Pazuello tem sido protagonista de duas crises que eu não esperava viver na minha vida: a primeira, sanitária; essa crise de mortes, casos e perdas que o Brasil sofre, o Brasil todo dia de luto. E uma que eu não esperava ver mais, que é uma crise militar; pensei que já tinha acabado na história. E o Pazuello tem sido protagonista dessas duas coisas. Para o Brasil, a melhor coisa hoje era que ele saísse de cena.
Existe um projeto que ganhou força na Câmara após esse episódio para impedir que militares da ativa ocupem cargos no governo. O senhor acha importante ter essa separação?
Diante do que tá acontecendo é importante, mas tem que ser visto com muito cuidado, tem que ser discutido com os próprios militares da ativa e aquelas lideranças mais representativas da reserva para que não se faça, e não é objetivo, nenhum tipo de movimento que não seja homogêneo com o sentimento da grande maioria das Forças Armadas brasileiras, que são instituições de Estado, precisam ser preservadas e também com a manutenção da harmonia com o Congresso e o Judiciário.
Semana que vem vai ocorrer a oitiva com o primeiro governador na CPI, e depois ainda há outros oito convocados. É possível levar essa apuração do governo federal e também ouvir os governadores ao mesmo tempo?
Eu não acho que vá ter tempo para ouvir outros governadores. O caso do Amazonas e de Manaus é muito específico. Aliás, foi em função dos acontecimentos de Manaus, da omissão e dos erros que aconteceram lá, que essa CPI foi instalada. E há uma certa coincidência nos depoimentos que de uma maneira responsabiliza também o governo do estado e o secretário de Saúde. Esse é um caso muito específico, tem que ser ouvido. Acho que os outros, no decorrer do tempo, com tantas coisas acontecendo, não serão prioridade.
Quais os principais pontos da investigação na CPI até agora, na visão do senhor?
A demora da compra de vacinas, e agora com os vídeos e documentos que estamos obtendo, sabemos que foi uma demora deliberada. Não foi, como em princípio eu achava, uma demora por negligência, por incompetência. Há também o conselho paralelo, que tinha mais força até do que os órgãos oficiais. Isso também está comprovado e é bastante irregular. Há, ainda, a questão da cloroquina, que nos leva a outro ponto, que é a tese da imunidade de rebanho. Esse pensamento não está comprovado, mas a percepção de fixação na cloroquina tem a ver com esse pensamento.