A saída repentina dos líderes militares ocorreu um dia depois que o presidente Jair Bolsonaro demitiu o ministro da Defesa e reformulou seu gabinete.
Os três comandantes das Forças Armadas do Brasil renunciaram conjuntamente na terça-feira, um dia depois que o presidente Jair Bolsonaro demitiu o ministro da Defesa como parte de uma grande sacudida no gabinete.
A saída de líderes militares, que se seguiu à inesperada substituição na segunda-feira de cinco outros membros do gabinete, alimentou especulações galopantes na capital sobre um colapso na relação entre o presidente e os militares do país, que desempenharam um papel central no governo Bolsonaro.
“A demissão dos chefes do Exército, da Marinha e da Força Aérea após a mudança repentina na liderança do Ministério da Defesa não tem precedentes desde que a democracia foi restaurada”, disse o deputado Rodrigo de Castro em um comunicado. “Revela uma verdadeira crise entre os militares e o governo.”
A turbulência política em Brasília ocorre enquanto o governo enfrenta críticas acirradas, incluindo pedidos pelo impeachment de Bolsonaro, por seu tratamento arrogante e caótico da pandemia Covid-19, que já matou mais de 313.000 brasileiros. Um surto de infecções sobrecarregou hospitais em todo o país, fazendo com que pacientes morressem esperando por uma cama de hospital.
Bolsonaro, um ex-capitão do Exército, deu aos militares um papel de liderança na política e na formulação de políticas no Brasil, confiando a seus líderes o maior poder que tiveram desde o fim da ditadura militar do país em meados da década de 1980. Ele escolheu um general da reserva do Exército como companheiro de chapa e nomeou os principais líderes militares para diversos cargos governamentais seniores normalmente ocupados por civis.
Generais da reserva e analistas militares no Brasil lutaram para entender as mudanças desta semana, que nem o presidente nem os comandantes cessantes explicaram.
“Não faz sentido do ponto de vista político ou administrativo”, disse Carlos Alberto dos Santos Cruz, general da reserva do Exército que ocupou um cargo importante no governo de Bolsonaro até junho de 2019. “É preciso haver uma explicação de por que isso aconteceu, caso contrário, transmite desrespeito pelos indivíduos e pelos papéis. ”
Mariana Kalil, professora de geopolítica do Colégio Nacional de Guerra, disse que o presidente parecia ter um apoio mais forte nos escalões inferiores do exército do que entre os altos escalões. Ela disse que os chefes podem ter cortado relações com um presidente em apuros políticos para enviar uma mensagem clara de que as Forças Armadas não cumpririam suas ordens políticas.
“Sempre houve a hipótese de um comandante militar apoiando políticas governamentais mais repressivas, coisas fora dos limites da lei”, disse Kalil. Mas ela disse que os líderes militares brasileiros desempenharam uma força “moderadora” em um governo liderado por um presidente ousado e combativo que transformou muitos aliados em inimigos.
O senador Tasso Jereissati, uma importante figura da oposição, disse que como Bolsonaro se envolveu com o Congresso e enfrentou o escrutínio nos tribunais, “ele sempre insinuou que as Forças Armadas o protegem”.
Como o presidente escolheu novas brigas com outras autoridades eleitas sobre os bloqueios propostos, os líderes militares podem ter decidido abandonar o navio em vez de serem vistos como cúmplices no tratamento desastroso da pandemia, disse o senador Jereissati.
“Estamos pagando o preço de eleger um indivíduo totalmente despreparado para o trabalho, rude e desequilibrado”, disse ele.
Desde que assumiu o cargo em janeiro de 2019, Bolsonaro concedeu aos líderes militares um tremendo poder nas agências governamentais – e, ao fazer isso, vinculou sua reputação à dele. Os líderes militares falharam nas missões centrais que Bolsonaro lhes deu, incluindo supervisionar a resposta à pandemia e controlar o desmatamento na Amazônia.
A relação do presidente com seu vice-presidente, o general da reserva Hamilton Mourão, e o ministro da Defesa que está deixando o cargo, general Fernando Azevedo e Silva, ficou tensa nas últimas semanas, segundo analistas, com o agravamento da crise do coronavírus no país.
Na semana passada, o presidente substituiu seu ministro da saúde, Eduardo Pazuello, um general da ativa que não conseguiu liderar uma resposta abrangente à pandemia nem negociar a compra de uma quantidade suficiente da vacina Covid-19.
Em sua carta de demissão, o general Azevedo e Silva disse que buscou “preservar as Forças Armadas como uma instituição do Estado”. A frase parecia transmitir a crença de que Bolsonaro havia procurado politizar as forças armadas.
A renúncia dos três comandantes militares – General Edson Pujol do Exército; Tenente-General Antonio Carlos Moretti Bermudez, da Força Aérea; e Almirante Ilques Barbosa Junior, da Marinha – foi anunciado em breve comunicado do Ministério da Defesa. Não forneceu um motivo.
As mudanças de gabinete de segunda-feira incluíram a saída do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, um linha-dura.
Por: Ernesto Londoño, do Rio de Janeiro, e Letícia Casado, de Brasília.
Fonte: https://www.nytimes.com/2021/03/30/world/americas/brazil-bolsonaro-military-resignations.html