Trinta anos após ser alçado ao Governo do Ceará pela primeira vez, o senador Tasso Jereissati (PSDB), que voltou ao cargo outras duas vezes, olha para trás e reconhece erros e injustiças cometidos, mas também celebra conquistas da gestão que considera marcante para o Estado.
Em entrevista ao O POVO, ele também afirma que não pretende se candidatar novamente a um cargo eletivo. Em análise do cenário atual, diz que houve retrocessos e que “não dá mais para ter governos medíocres no Ceará”. Veja os principais trechos da conversa.
O POVO – Como avalia sua trajetória política hoje, 30 anos depois da 1ª eleição?
Tasso Jereissati – Quando eu me candidatei naquele tempo foi mais uma aventura do que um projeto claro de política de que iríamos ganhar a eleição. A oposição, que tinha sido totalmente massacrada durante o período militar, praticamente não existia no Ceará porque as grandes forças políticas tinham se unido redor do PFL. O então governador Gonzaga Mota, que era muito ousado, decidiu lançar um nome fora da política, totalmente novo, inesperado, como uma forma de tentar seguir um caminho novo. E nós aceitamos aquilo não para ganhar eleição, mas dentro daquele clima de otimismo mostrar que tinham caminhos diferentes daqueles tradicionais que vínhamos seguindo durante os últimos 30, 40 anos ou mais, no Ceará. Foi uma campanha inesquecível para mim, porque a estrutura que nós tínhamos era mínima e a adesão da população foi com um entusiasmo inacreditável. Ganhamos com essa responsabilidade, de poder responder à esperança e à expectativa que o povo do Ceará tinha.
OP – O que foi mais difícil?
Tasso – No primeiro mandato, foi uma oposição fortíssima. O que foi muito bom, porque me controlou e me vigiou muito, me criticou muito, muitas vezes até injustamente, mas serve para a gente ter muito cuidado e andar no passo certo. Uma das coisas que me decepciona muito é que a cooptação da oposição virou uma regra, e os governos ficam praticamente sem oposição. Um governo sem oposição é um passo para a arrogância, para a prepotência e para o desmando. Há algum tempo, o Ceará está com um governo sem oposição, que é aniquilada ou cooptada.
OP – Além disso, o Ceará passou por muitas greves.
Tasso – Eu enfrentei muitas greves, não só a da Polícia, porque nós tínhamos que tomar medidas duríssimas. Quando eu assumi o Governo, a folha de pagamento era maior do que a receita. Então, nós fizemos um levantamento e tinha gente trabalhando com quatro, cinco empregos, milhares de funcionários que jamais tinham ido trabalhar e que moravam, inclusive, no exterior. Nós fizemos um corte muito brusco e isso gerou uma reação enorme de todos os setores.
OP – O que o senhor acha que mais marcou no seu Governo?
Tasso – Essa mudança de mentalidade e a maneira de administrar. Primeiro, a responsabilidade fiscal, no sentido do cuidado com o dinheiro público. A prioridade do serviço público para o mais pobre, porque são esses que precisam do serviço público. O mérito, a luta contra o fisiologismo e do clientelismo, que diminuiu muito. Infelizmente está voltando agora aos poucos, essa é a vitória que nós não conseguimos inteiramente. Mas ainda tem um rescaldo dela muito grande que é ocupar os lugares públicos mais importantes de direção pelo mérito e não pela ligação política. Acho que na política, hoje, muita coisa regrediu, muita coisa do fisiologismo, a questão do mérito também é uma questão que já não é tão prioridade, se está colocando em segundo plano. Há uma disciplina fiscal, mas não há uma rigidez nos investimentos que realmente darão retorno para a maioria da população e quais são as prioridades. Acho que a responsabilidade fiscal praticamente se consolidou, há uma consciência social que também se consolida. Algumas coisas regrediram e outras avançaram.
OP – O senhor se arrepende de alguma aliança feita ao longo desses anos?
Tasso – Não, eu acho que a vida política é assim, feita de vitórias, derrotas, de alianças e decepções e traições, umas mais explícitas, outras menos. Eu julgo que, ao contrário do que dizem, nós geramos muitas lideranças, que quiseram seguir com legitimidade seu próprio caminho e às vezes até renegando qualquer ligação.
OP – O senhor pensou alguma vez em ser presidente?
Tasso – Eu não pensei nem em ser governador, foi muito mais do que eu esperava. Acho que também já não tenho mais nenhum projeto pessoal. Meu projeto hoje seria tentar renovar a política do Ceará e tenho tentado muito, confesso que tenho conseguido muito pouco, mas meu grande projeto é tentar o processo de renovação da política do Ceará. Não dá para ter mais governos medíocres no Ceará. O Ceará precisa de pulos, precisa dar um saltos, porque nós temos um processo social e econômico muito atrasado, e para recuperar esse tempo perdido nós precisamos dar saltos e ousadia para romper parâmetros que estão aí hoje. (Letícia Alves)
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